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La Casa de Papel: parte 4 apresenta personagem trans, mas interpretada por uma atriz cisgênero

A nova temporada de La Casa de Papel estreou no início desse mês, com episódios ainda mais frenéticos e planos mirabolantes do jeito que os fãs gostam. Temos também a introdução de uma nova personagem, Manila, que se revela sendo transexual. O mistério em torno dela já havia começado desde a parte 3, entretanto, o segredo sobre a nova assaltante só é revelado no episódio 4×5.

Mas quem é Manila?

Durante o episódio, é mostrado um flashback do primeiro assalto à casa da moeda. Denver e seu pai, Moscou, contam para o Professor que possuem um parente encarcerado prestes a ser solto. Ele se chama Juanito, primo de Denver, que ambos prometeram cuidar quando saísse da cadeia.

Os dois tentam convencer o Professor de incluir o garoto no assalto quando ele saísse da prisão. Pedido esse que, obviamente, foi negado. Após um diálogo sobre família com Berlim, o líder do bando decide ajudar o “rapaz” que se revela uma mulher trans quando desce do ônibus.

La Casa de Papel - Manila 2

Agora com o nome de Julia, ela reencontra os parentes em uma cena tocante. Na qual Denver e Moscou encaram toda a mudança com certa naturalidade, dando mais valor a quem a pessoa é por dentro e não por fora. Neste novo golpe Julia utiliza o codinome de Manila, agindo como uma refém infiltrada.

Até aí tudo bem, só que o problema é que essa personagem transexual é interpretada por uma mulher cisgênero, ou seja, sempre se identificou com o gênero que lhe foi imposta ao nascer.

Ainda falta espaço para pessoas trans

É importante ressaltar que a Netflix é uma das plataformas mais abertas para esse tipo de assunto. Séries como Sense8 são a prova viva disso. No entanto, colocar atrizes trans em papéis chave como esse é de extrema importância nos tempos atuais. Pois além de não vermos muitas atrizes trans em evidência, os poucos papéis que restam são tirados dessas profissionais.

Ao ser questionada sobre o assunto, Belén Cuesta, interprete de Manila, disse em entrevista ao El Español apoia a causa das pessoas trans e que há uma liberdade no mundo artístico para atores de gêneros diversos interpretarem papéis diferentes. Ela ainda cita que atrizes transexuais podem interpretar mulheres cis e vice versa. O que não é mentira, mas não é bem assim que vemos atualmente.

La Casa de Papel - Manila

Essa fala me fez lembrar o discurso de Viola Davis quando ganhou o Emmy de melhor atriz. Ela foi a primeira mulher negra a vencer nessa categoria pela série How to Get Away With Murder. Quando subiu ao palco, Viola disse uma frase que se encaixa bem quando falamos de minorias: “a única coisa que separa mulheres de cor de qualquer outra pessoa é a oportunidade”.

Vale lembrar também que isso foi em 2015, sessenta e seis anos desde a primeira edição da premiação. Levou mais de meio século para uma atriz negra vencer um prêmio importante como esse. E é exatamente de oportunidades assim que pessoas trans necessitam mais do que nunca.

O que Belén pode não ter percebido é que, ao aceitar o papel, ela tirou uma das poucas grandes oportunidades que existem para pessoas dessa comunidade. Temos que levar em consideração que, como profissional, é uma série de muito destaque para qualquer ator e que nesse ponto não é certo julgá-la. Pois seria difícil para muitos recusar tamanha visibilidade.

Oportunidades perdidas

Eddie Redmayne em “A Garota Dinamarquesa”

Não é a primeira vez que algo desse tipo acontece na indústria. Em 2015, Eddie Redmayne interpretou a artista transexual Lili Elbe no filme “A Garota Dinamarquesa”. Baseado em fatos reais, o longa conta a história dessa personagem que foi a primeira a tentar realizar a cirurgia de redesignação sexual.

Já em “Clube de Compras Dallas”, de 2014, Jared Leto interpreta a travesti Rayon. Ambos os filmes tiveram uma grande visibilidade e foram muito premiados. Os dois também contavam histórias emocionantes sobre os dramas vividos por pessoas trans, passando uma importante mensagem. Por outro lado, eles exaltam o talento de artistas já consagrados –Jared ganhou um Oscar por esse papel.

A fala de Belén ao defender La Casa de Papel cita uma realidade muito bonita, mas que não existe na prática. É raríssimo ver um ator ou atriz transexual interpretando um personagem cisgênero. Eles existem, todavia, em número muito menor do que o necessário.

Scarlett Johansson
Scarlett Johanson já recusou interpretar um personagem trans

Talvez faltou um pouco mais de sensibilidade como foi o caso de Scarlett Johanson. Em 2018 a atriz foi escalada para interpretar um homem trans no filme Rub & Tug. Após ser criticada por retirar o espaço de artistas LGBTQIA+, Scarlett foi relutante no início e depois entendeu o quanto essas oportunidades são escassas. Ela recusou o papel.

Presos ao estereótipo

A fala da intérprete de Julia em La Casa de Papel não é inteiramente equivocada. Artistas transexuais podem e devem interpretar papéis cisgêneros e a arte realmente concede essa liberdade. Só que quando paramos para pensar sobre o cenário atual vem a dúvida: quantas pessoas trans vemos em papéis cisgênero de destaque?

Quando falamos em oportunidade, devemos reforçar também que é de maneira geral. Não queremos que nossa comunidade fique presa ao estereótipo e interprete apenas papéis LGBTQIA+, pelo contrário. Entretanto, ver as poucas oportunidades de destaque sendo tiradas de nós é triste, muito triste.

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Angelo Prata

Jornalista apaixonado pela arte do século XXI chamada de videogame. Tentando melhorar a internet um post de cada vez, este sagitariano que vos fala tem dificuldades em escolher um jogo favorito. As séries Super Mario, Resident Evil, Donkey Kong e Mass Effect estão no top da minha lista imaginária e sim, sou fã da Nintendo!

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